
Por Catiane Magalhães
O universo futebolístico é um dos poucos ambientes que podemos chamar de democrático. Pelo menos no que diz respeito ao espaço destinado a jovens de classe média alta, como Kaká, e a meninos oriundos da favela, a exemplo de Adriano, Ronaldo, Robinho e Vagner Love. Estes, aliás, ocupam uma posição de vantagem diante dos garotos bem nascidos, uma vez que são maioria nesse cenário.
A prerrogativa, entretanto, é apenas numérica. Após alcançar o mesmo patamar dos meninos ‘brancos’ e providos de alguma condição financeira e intelectual, os garotos ‘pretos’ e pobres traçam seu regresso às origens, contrariando a máxima popular que afirma que quem conhece o melhor da vida não mais se acostuma com nada inferior.
Se algum ditado se aplica nesse mundinho é o que diz: “pode-se tirar um pobre da favela, mas nunca a favela de um pobre”. O jogador Adriano é a prova viva de que a vida no morro não é tão ruim como se imagina, a ponto de querer abrir mão de todo o conforto e da suposta segurança que o dinheiro oferece para voltar a morar no lugar onde, segundo o próprio, é o único capaz de sentir-se verdadeiramente em paz e feliz.
O motivo mais provável para que rapazes como Adriano percorram o caminho de volta é a falta de preparo emocional e principalmente psíquico para lidar com os excessos – de dinheiro, fama, farra, mulheres e reconhecimento –, já que conheceram e conviveram na total escassez.
Como toda mudança radical, esta ascensão repentina, de fato, deve mexer muito com a cabeça dessas pessoas, fazendo-os experimentar diversas sensações. Num primeiro momento, a euforia de ter tudo o que o dinheiro pode oferecer e posteriormente a frustração de saber que salário milionário não é sinônimo de felicidade e muito menos de privacidade.
Tanto que, não raro eles alimentam as páginas policiais da imprensa escrita, falada e televisionada, protagonizando escândalos homéricos. Quem não se lembra da fenomenal “engano” do craque Ronaldo ao levar travestis para o motel pensando ser mulher? O episódio foi repercutido na mídia por semanas a fio.
E o namorador do Palmeiras, que por fugir da concentração para encontros amorosos recebeu o singelo e bem sugestivo apelido de Vagner Love, ao comemorar a vitória do seu time, posou para fotos ao lado de traficantes, quer dizer, de amigos de infância que não tiveram o mesmo talento e sorte que ele e por isso se enveredou por outros caminhos nada esportivos? O problema não foi ser clicado ao lado dos velhos conhecidos, mas exibir os acessórios que estes ostentavam com certo orgulho: armas de grosso calibre e, digamos, de origem duvidosa.
Mas, até o surgimento caso Bruno, o líder absoluto em números de manchetes policiais era o imperador. Primeiro, com a crise existencial, que deu origem a seu ‘sumiço’ temporário, resultando em sua ‘hospedagem’ na casa de amigos no morro onde nasceu. Na ocasião, ele chegou a divulgar oficialmente o encerramento da carreira, abrindo mão do luxo e conforto que a profissão lhe proporcionava com o altíssimo salário pago pelo clube estrangeiro o qual mantinha contrato.
Pelo visto, não era só do morro e dos amigos que Adriano sentia saudade, mas do barraco propriamente dito. Não demorou muito para ele voltar a estampar as capas dos jornais, ‘saindo na mão’ com a então noiva, como diria o ex-goleiro do Flamengo.
Naquele momento, o camisa um do rubro-negro carioca deu uma demonstração gratuita do seu temperamento violento, com a declaração polêmica, que, diga-se de passagem, não poderia vim em melhor data: Dia Internacional da Mulher, quando ia ao ar uma matéria sobre o aumento da violência doméstica contra esse público.
Dias depois, ele não só colocou em prática o funk ‘só um tapinha não dói’, como foi para além da agressão, assassinando brutalmente a ex-namorada Eliza Samudio, com requinte de crueldade que nenhum roteirista de filme de terror jamais ousou a escrever um crime tão bárbaro.
Quem sabe a sua origem pobre e de escasso acesso à informação e conhecimento, ou mesmo o deslumbramento com o excesso de dinheiro e ‘poder’ lhe impossibilitou ver que não há crime perfeito? Como pena, ele está condenado não apenas a passar longos anos no submundo do presídio, mas a encerrar precocemente uma carreira promissora.
O jovem goleiro, que sonhava com a Copa de 2014, não imaginou que ao participar, ainda que indiretamente, do assassinato da moça ele estaria cometendo também um suicídio profissional. Sim, porque agora ele não mais será lembrado pelas belas defesas que realizou ao longo da sua trajetória, mas pelo perigoso ataque que desferiu contra a mãe do seu filho bastardo.
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