segunda-feira, 30 de agosto de 2010

A (R)evolução dos bichos



Por Catiane Magalhães

Que há gente parecida com bicho eu nunca tive dúvidas. E não me refiro à estética apenas. Além da aparência, do aspecto e do modo de vida, muitos seres humanos fazem questão de se comportarem como tais, ignorando por completo todo o processo de civilização que o mundo sofreu.

Um exemplo claro desse retrocesso é a ‘necessidade’ humana de urinar em vias públicas, mais especificamente em postes, árvores, pilares de viadutos e pontes ou qualquer parede que lhes dê apoio na hora do ato. O faz como se bicho fosse. E, neste caso, com uma vantagem a mais e um esforço a menos em comparação aos colegas cachorros, já que nem se dão ao trabalho de elevar o membro inferior (isso para não dizer a pata).

O mijo aqui só foi citado porque esteve em alta nas últimas semanas. A ponto de fazer o chefe do executivo municipal da capital baiana criar uma lei para combater a prática, que, diga-se de passagem, está ameaçando a estrutura dos viadutos e pontes da cidade, além de ser apontada como uma das prováveis causa do desabamento da Fonte Nova.

Mas os motivos que me levam a falar da humanização dos bichos não são os parentes distante dos macacos, que se comportam como cachorro, vivem como porcos e ‘pensam’ como os burros. Não! Quero falar é do modismo criado pela televisão em humanizar os bichos – os de pêlos e penas e, até então, irracionais e incapazes de falar a nossa língua –.

Quem pensou que a racionalidade e o dom da comunicação verbal e clara fosse privilégio do homem viu sua tese ir ralo abaixo. A TV não só mostra que não é, como prova o contrário: há bichos mais inteligentes que gente. Duvidam? Quem acompanha o programa matinal da Globo – que até hoje eu não descobri se pretende ser informativo, de entretenimento ou de culinária, destinando receitinhas para dondocas que têm as manhãs livres – sabe do que estou falando.

Na disputa diária de piadas e charadas entre os seus apresentadores, a loura Ana Maria (Brega) e o Louro José, quem sai vencedor, com o maior número de acertos? O papagaio de espuma verde e de voz irritante se mostra superior à colega. Aliás, neste e em outros aspectos, os quais não entraremos nos méritos.

E quem achou cafona a iniciativa da Loura Brega em levar o bicho de pelúcia para o estúdio global tratou logo de se acostumar com a tendência, já que não adianta acionar o botão do controle remoto e trocar de canal. Agora, não é só papagaio que fala a nossa língua. As formigas, que passavam despercebidas, tamanha a sua insignificância e miudeza, se evoluíram.

Errou quem pensou que ela aprendeu a cantar como a cigarra para dá ao inseto o merecido troco na fábula em que sempre leva a pior. Ela se superou e se equiparou a mais respeitada das espécies: o homem. Sim, as formiguinhas já falam a nossa língua e são capazes de raciocinar como nós. Pelo menos, as de pelúcia do programa da Band, O Formigueiro, estrelado por Marco Luque, integrantes também do CQC, na mesma emissora.

O que leva a produção de tais programas a investir nesse formato de comunicação eu desconheço, mas acredito que se trata de uma aposta no entretenimento e na leveza. E, por mais que eu não goste desse ‘recurso pedagógico’, devo admitir que ele tem sua eficácia, já que permanece no ar há tanto tempo e cada vez mais ganha novos adeptos.

O histórico é antigo. Já na década de 80, Xuxa (não o nadador, mas a rainha dos baixinhos) já se apresentava no seu programa matinal com a dupla Praga e Dengue, uma tartaruga anã e um mosquito gigante, respectivamente. Pelo menos, o público alvo do programa era outro: as crianças. E a linguagem também!

Depois veio a TV Colosso, com sua cachorrada falante. O formato não agradou e logo foi substituído pelo Caça Talentos, programas estrelado pela 'Fada Bela', marcando a estreia de Angélica na emissora do Plim-plim, e tantos outros onde havia bichos que falam, pensam e sentem como gente.

O que não compreendo é esse retrocesso da televisão brasileira do século XXI em recorrer a artifícios utilizados no século passado para entreter adultos, quando eles não funcionam mais nem com as crianças? Se alguém duvida, basta pegar um pimpolho de hoje e colocá-lo diante da TV para assistir a um desses programas. Certamente, personagens e linguagem vão lhe soar um tanto infantil e antiquado.

Ainda assim, as emissoras continuam apostando na infantilização do seu público, colocando-os para dialogar com bichinhos ‘mais evoluídos’. Ou ninguém se deu conta que automaticamente está saindo na desvantagem, se comparado ao animal?

Não demora e teremos todo o zoológico na nossa sala de casa, através da televisão, nos aconselhando, indicando livros e receitas e fazendo piadas a nosso respeito, como o faz o Louro José com a sua companheira de programa.

Jogadas Perigosas



Por Catiane Magalhães

O universo futebolístico é um dos poucos ambientes que podemos chamar de democrático. Pelo menos no que diz respeito ao espaço destinado a jovens de classe média alta, como Kaká, e a meninos oriundos da favela, a exemplo de Adriano, Ronaldo, Robinho e Vagner Love. Estes, aliás, ocupam uma posição de vantagem diante dos garotos bem nascidos, uma vez que são maioria nesse cenário.

A prerrogativa, entretanto, é apenas numérica. Após alcançar o mesmo patamar dos meninos ‘brancos’ e providos de alguma condição financeira e intelectual, os garotos ‘pretos’ e pobres traçam seu regresso às origens, contrariando a máxima popular que afirma que quem conhece o melhor da vida não mais se acostuma com nada inferior.

Se algum ditado se aplica nesse mundinho é o que diz: “pode-se tirar um pobre da favela, mas nunca a favela de um pobre”. O jogador Adriano é a prova viva de que a vida no morro não é tão ruim como se imagina, a ponto de querer abrir mão de todo o conforto e da suposta segurança que o dinheiro oferece para voltar a morar no lugar onde, segundo o próprio, é o único capaz de sentir-se verdadeiramente em paz e feliz.

O motivo mais provável para que rapazes como Adriano percorram o caminho de volta é a falta de preparo emocional e principalmente psíquico para lidar com os excessos – de dinheiro, fama, farra, mulheres e reconhecimento –, já que conheceram e conviveram na total escassez.

Como toda mudança radical, esta ascensão repentina, de fato, deve mexer muito com a cabeça dessas pessoas, fazendo-os experimentar diversas sensações. Num primeiro momento, a euforia de ter tudo o que o dinheiro pode oferecer e posteriormente a frustração de saber que salário milionário não é sinônimo de felicidade e muito menos de privacidade.

Tanto que, não raro eles alimentam as páginas policiais da imprensa escrita, falada e televisionada, protagonizando escândalos homéricos. Quem não se lembra da fenomenal “engano” do craque Ronaldo ao levar travestis para o motel pensando ser mulher? O episódio foi repercutido na mídia por semanas a fio.

E o namorador do Palmeiras, que por fugir da concentração para encontros amorosos recebeu o singelo e bem sugestivo apelido de Vagner Love, ao comemorar a vitória do seu time, posou para fotos ao lado de traficantes, quer dizer, de amigos de infância que não tiveram o mesmo talento e sorte que ele e por isso se enveredou por outros caminhos nada esportivos? O problema não foi ser clicado ao lado dos velhos conhecidos, mas exibir os acessórios que estes ostentavam com certo orgulho: armas de grosso calibre e, digamos, de origem duvidosa.

Mas, até o surgimento caso Bruno, o líder absoluto em números de manchetes policiais era o imperador. Primeiro, com a crise existencial, que deu origem a seu ‘sumiço’ temporário, resultando em sua ‘hospedagem’ na casa de amigos no morro onde nasceu. Na ocasião, ele chegou a divulgar oficialmente o encerramento da carreira, abrindo mão do luxo e conforto que a profissão lhe proporcionava com o altíssimo salário pago pelo clube estrangeiro o qual mantinha contrato.

Pelo visto, não era só do morro e dos amigos que Adriano sentia saudade, mas do barraco propriamente dito. Não demorou muito para ele voltar a estampar as capas dos jornais, ‘saindo na mão’ com a então noiva, como diria o ex-goleiro do Flamengo.

Naquele momento, o camisa um do rubro-negro carioca deu uma demonstração gratuita do seu temperamento violento, com a declaração polêmica, que, diga-se de passagem, não poderia vim em melhor data: Dia Internacional da Mulher, quando ia ao ar uma matéria sobre o aumento da violência doméstica contra esse público.

Dias depois, ele não só colocou em prática o funk ‘só um tapinha não dói’, como foi para além da agressão, assassinando brutalmente a ex-namorada Eliza Samudio, com requinte de crueldade que nenhum roteirista de filme de terror jamais ousou a escrever um crime tão bárbaro.

Quem sabe a sua origem pobre e de escasso acesso à informação e conhecimento, ou mesmo o deslumbramento com o excesso de dinheiro e ‘poder’ lhe impossibilitou ver que não há crime perfeito? Como pena, ele está condenado não apenas a passar longos anos no submundo do presídio, mas a encerrar precocemente uma carreira promissora.

O jovem goleiro, que sonhava com a Copa de 2014, não imaginou que ao participar, ainda que indiretamente, do assassinato da moça ele estaria cometendo também um suicídio profissional. Sim, porque agora ele não mais será lembrado pelas belas defesas que realizou ao longo da sua trajetória, mas pelo perigoso ataque que desferiu contra a mãe do seu filho bastardo.

domingo, 13 de junho de 2010

O País de chuteiras

Por Catiane Magalhães

Se alguém tinha dúvidas agora não tem mais: futebol é mesmo a paixão nacional. Os recordes de bilheteira em jogos de clubes de segunda e terceira divisão e, literalmente, maus das pernas, comprovam isso. Fiéis e fanáticos torcedores lotam as arquibancadas dos estádios para oferecer apoio moral aos times do coração, mesmo que estes não correspondam as suas expectativas e, sobretudo, a sua paixão.

Em ano de Copa do Mundo esse sentimento fica mais veemente. A ponto de pautar e parar um país inteiro. Quem dera fosse exagero, mas não é! Os escândalos políticos, a economia, inflação, as descobertas científicas, o mundo da moda e qualquer outra notícia ficam em segundo plano quando o assunto é o mundial.

O Brasil inteiro respira a Copa. E o inteiro aqui não é força de expressão, já que nesta época aparecem os torcedores bissextos, atraídos pelo poder de mobilização e de sedução do mundial. Aliás, patriotismo brasileiro só existe a cada quatro anos e dentro de um campo de futebol. Afora isso, os filhos deste solo não fazem qualquer esforço para defender sua mãe gentil.

Só mesmo uma paixão nacional para mobilizar o povo brasileiro em prol de uma causa: mais um título. Por ele, é possível até rever os “cara-pintadas”. Não! Não estou misturando futebol com política. Tampouco me referindo ao movimento estudantil do início da década de 90 contra a corrupção, mas aos milhares de brasileiros que se pintam de verde e amarelo para, diante da televisão, assistir aos jogos. Esse mesmo povo que, também pela televisão, tomam conhecimento, de forma passiva, das mazelas do País e a nada reage.

E como adoramos (e até acreditamos) em desculpas esfarrapadas, já conhecemos o discurso: “um povo sofrido que vê no futebol a esperança e o caminho da felicidade”. E vê mesmo! Basta a bola rolar, ou melhor, antes mesmo disso acontecer para ignorar todos os problemas de ordem social, política e econômica.

Tudo fica azul! E verde, amarelo e branco também! O país ganha novas cores, o povo, mais confiança e estímulo. Na imprensa, as editorias de polícia e política perdem espaço para a de esporte em número de manchetes e notícias repercutidas. Não se fala em outra coisa: Jabulani é, literalmente, a bola da vez.

Ela só divide espaço com termos como vuvuzelas, bafana bafana e outros tantos que remetam à Copa da África do Sul. Aliás, sorte a daquele país que deixou de ser sinônimo de miséria, desigualdade, fome, preconceito e AIDS para ser o centro das atenções do mundo inteiro. Como nada mais me resta além de torcer, ficarei diante da televisão à espera de um resultado favorável. Não no placar, mas para que após o dia 11 de julho (final do mundial de 2010) as lentes das câmeras de toda a imprensa e os olhos do universo continuem voltados para lá.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Política no Brasil é coisa séria, tanto quanto piada

Por Catiane Magalhães


Como disse o ex-senador Antônio Carlos Magalhães (ACM), numa de suas sábias declarações, “mais importante que o dinheiro é o poder”! A afirmação explica e justifica o interesse de muitos por um cargo que lhes proporcione mais visibilidade e status do que um salário oficialmente atrativo. Digo oficialmente porque as cifras impressas no contracheque, por mais significativas que sejam, tornam-se praticamente irrisórias diante da possibilidade de multiplicação proporcionada pelo poder propriamente dito.

Trocando em miúdos, ser poderoso é também garantia de um polpudo salário oficioso. E não sou eu quem diz, os gastos com campanhas políticas estão aí para comprovar que, teoricamente, os investimentos são bem maiores que os retornos.

Sendo assim, será por que há tanta gente que não quer largar as tetas da mãe gentil? E outros tantos disputando, à tapas e farpas, uma vaguinha para sugar e mamar nos seios da pátria amada? Se o médium Chico Xavier estivesse neste plano, com certeza ele psicografaria a resposta dada pelo cacique baiano. Aliás, dadas às devidas distinções do contexto, da época e, é claro, do comportamento, vocabulário, postura e compostura, ACM e Serginho (Ex-BBB) disseram a mesma coisa sobre dinheiro versus poder.

E só citei o Serginho para falar dos colegas, ex-BBBs, que manifestaram interesse pela política. No próximo pleito, por exemplo, possivelmente teremos dois brothers como opção nas urnas: Kléber Bambam (vencedor da primeira casa) e o baiano Jean Willys (que levou o prêmio na quinta edição do reality show).

O primeiro, como já era de se esperar, causou polêmica ao declarar que pretende estudar para aprender fazer política e lidar com pessoas, tendo como principal “mestre” o cunhado veterinário. Errado? Não! Há profissão mais adequada para cuidar de burros? Sinceramente, um povo que elege representantes do naipe de Frank Aguiar, Clodovil, Leo Kret, Netinho de Paula, entre outras “celebridades”, sob o pretexto de protestar pela falta de opção, merece mesmo ser cuidado e receitado por um aspirante a político, aprendiz de veterinário.

O segundo, por sua vez, conta com o voto e a torcida do público gay e simpatizantes para repetir nas urnas a façanha de sair vitorioso, como o fez no Big Brother. E desta vez, o prêmio vai bem além do um milhão de reais, com uma vantagem: a casa que o proporcionará não é, nem de longe, a mais vigiada do País e por mais que façam, ninguém nuca vê ou sabe de nada!

Engana-se quem pensa que as opções eleitorais passam apenas pela fauna. Nossa flora também dá o ar da graça na política, representada pela Mulher Samambaia, e ainda passa pelo setor de hortifrúti, com a Mulher Melão. Se ser feio ainda está na moda eu não sei, mas que entrar para a política agora é uma tendência, isso é. Até a fanqueira Taty Quebra Barraco, autora da pérola, quer garantir a sua pontinha, ou melhor, sua vaguinha!

Que o diga a “delegata” Paty Nuno, que, movida pelo clima de pré-campanha, compareceu ao velório de um amigo jornalista mais enfeitada que jegue na lavagem do Bonfim, ou melhor, como diria uma célebre conhecida, “toda trabalhada no ouro e nos paetês”, com correntes capaz de aprisionar meia dúzia de bandidos, tamanha era o comprimento e espessura dos apetrechos dourados e perolados. Já se achando a estrela eleita esqueceu a cerimônia fúnebre e começou a distribuir sorrisinhos, tchauzinhos e beijinhos aos futuros eleitores. Mico maior que esse foi desistir do cortejo rumo a crematório por não conseguir se equilibrar no salto agulha que teimava em prender-se no piso nada regular do cemitério.

Pelo visto, o caminho direto das delegacias para o palanque não será percorrido exclusivamente pela “delegata”. O seu colega, “doutor” Deraldo, o quase sócio do programa Na Mira, da TV Aratu (SBT), também manifestou interesse em atravessar essa ponte. Este certamente não disputará voto com a colega de profissão, mas com o ex (?) apresentador do programa, o qual há muito alimentou com notícias, como quem o faz com o filho. Sim, Uziel Bueno também é provável candidato a deputado. Neste caso, como diria o próprio, o sistema é bruto, já que o eleitorado é o mesmo!

Trégua mesmo deu o também apresentador, de programa igualmente popularesco, da emissora concorrente (TV Itapoan/Record), Raimundo Varela. Após várias tentativas de entrar para o mundo da política, inclusive com uma candidatura e posterior retirada da mesma, ele desiste definitivamente do sonho. Pelo menos, diretamente.

“Seu Valera”, como é chamado, pretende realizá-lo através da atual esposa. E, mesmo antes da campanha eleitoral ser autorizada, ele saiu na frente, dando a largada, embora nos bastidores, para difícil tarefa de transferir parte da sua popularidade à amada Sheila. Alguém pensou que era pura caridade, e sem qualquer propósito, aquela distribuição de peixes que a moça fez em plena Semana Santa? Isso sem falar da simbologia que o “bichinho” exerce no Partido Social Cristã (PSC), sua possível legenda.

E a lista é extensa. Entre brothers, cantores (dos mais variados ritmos), apresentadores, delegados e mulheres gostosonas, que ganharam evidência devido à seus atributos, ainda sobrou um lugar para o estilista Ronaldo Ésper, que espera abocanhar a vaga deixada pelo colega de profissão, Clodovil Hernandes, morto no ano passado. Quanto à candidatura de Ésper suponho que não precisamos temer, pois ele já mostrou que só rouba defuntos.

Os demais já podem começar a pensar nas propostas e promessas que farão para convencer seu eleitorado, isso é se não tiverem demasiadamente ocupados com a cruel dúvida de não saber que cor pintar as paredes de seus gabinetes (caso sejam eleitos) e que banheiro utilizar. Esta última, é claro, se aplica apenas àqueles com dúvidas sobre a própria sexualidade.

Depois ainda querem me convencer que política nesse país é coisa séria. Aliás, convencida já estou desde que ouvi um humorista global dizer que fazer os outros rir é coisa muito séria e que, portanto, não há seriedade maior que piada. Olhando por esse lado, faz todo sentido!

O que não é visto não é lembrado

Por Catiane Magalhães


Brasileiro tem mania de grandeza. Adora ostentar títulos de maiores e melhores em tudo. Melhor futebol, maior traseiro, maior carnaval e melhor novela. Para dar consistência a este último, tem até discurso pronto, que tornou-se clichê na boca do povo: “o Brasil está para a novela como Hollywood para o cinema”.

É bem verdade que a teledramaturgia brasileira (leia-se os novelões da Globo, já que nenhuma outra emissora conseguiu destaque no segmento) faz o maior sucesso mundo a fora. Não é à toa que vários países compram, a preço de ouro, o direito de reproduzir muitas delas.

Nem por isso torna-se motivo de orgulho, já que este tipo de narrativa é pouco valorizada por países desenvolvidos, com população de média e alta instrução. Em português claro estou dizendo que novela é, essencialemente, produto destinado a um povo com elevadas taxas de analfabetismo funcional.

Por outro lado, a novela é também um dos nossos poucos produtos democráticos, pois consege pautar a vida de boa parte dos brasileitos, independentemente de classe social e grau de instrução. A ponto de fazer o telespectador confundir realidade com ficção, levando para suas vidas não só a moda e o vocabulário da telinha, mas, e principalmente, o drama vivido pelos personagens. Em muitos casos, inclusive, o debate sai das salas das residências para as redações dos veículos de comunicação, tornando-se pauta para a imprensa.

Quem não se lembra das matérias sobre novas tecnologias de segurança que antecederam a estreia de Tempos Modernos? Na ocasião, compararam até o fictício Titan com um real edifício em Dubai, nos Emirados Árabes, considerado o mais seguro e vigiado do mundo.

Mas nenhum tema de novela mereceu mais destaque que a questão da acessibilidade aos cadeirantes durante os oito meses que Viver a Vida, de Manoel Carlos, esteve no ar. Como brasileiro tem memória curta, mal a novela acabou, o país inteiro, que compartilhou do drama de Luciana, personagem de Alinne Moraes, já esqueceu das dificuldades enfrentadas pelos cadeirantes da vida real.

Engraçado como temáticas que são batidas e rebatidas diariamente simplesmente desaparecem quando a trama que as abordam chega ao seu capítulo final. E agora não me refiro só aos veículos de comunicação, mas também ao telespectador, que elegeu o personagem como seu favorito, que levou para casa o seu drama, viveu, chorou e sofreu junto com ele, e que agora o substitui pelo mocinho(a) sofredor(a) do atual folhetim.

Assim foi com a leucêmica Camila, de Laços de Família; o cego Jatobá, de América; os alcóolatras Santana e Orestes, de Mulheres Apaixonadas e Por Amor, respectivamente; a excepcional Clara, de Páginas da Vida, e tantos outros que encarnaram algum drama, na ocasião amplamente debatido, mas agora ligeiramente esquecido.

Todos estes temas foram pautas, motes de campanha politicamente corretas. E hoje, alguém vê ou lê uma linha sobre algum deles? A bola da vez é a reencarnação, abordada na novela Escrito nas Estrelas. Parafraseando o presidente Lula, já que também o termo está na moda, “nunca na história desse país”, se falou tanto em espiritismo como agora.

A temática é abordada até por pregadores de outras religiões, enquanto as outras entram pelo processo de amnésia parcial dos mesmos telespectadores que um dia as deram audiência. Quem sabe quando a trama for reprisada no vespertino Vale a pena ver de novo, tais assuntos não voltem à tona? Com certeza, o Vídeo Show dará um jeitinho de ressuscitar o defunto.

O outro lado da moeda



Por Catiane Magalhães

Parafraseando o presidente Lula, nunca na história desse país um feriado nacional foi tão inexpressivo como o 1º de maio – Dia do Trabalho –. E não vou atribuir a culpa ao calendário, por ter caído num sábado, dia de folga para a maioria dos trabalhadores, exceto aos que atuam no comércio, indústria e serviços de emergência. Ainda que caísse em plena segunda-feira, chamada de ‘dia de branco’, iria, do mesmo modo, passar pálido e despercebido para os trabalhadores ávidos por um ócio, seja para descansar ou para servir de plateia de manifestações em dia como este.

Mas a história parece ter sido apagada e o Dia do trabalhador transformado em um feriado qualquer. O motivo? É que os manifestantes mudaram todos de lado. Eles (os movimentos de esquerda), que historicamente sempre estiveram na condição de estilingue pronto a dar a primeira de tantas badogadas, experimentam a estranha sensação agridoce de está na condição de vidraça. Sim, agridoce por ter necessariamente que experimentar do mel e do fel que o poder proporciona, e, diga-se de passagem, nem sempre na mesma proporção.

Afora pequenos e isolados movimentos, pouco se viu ou ouviu falar das reivindicações trabalhistas promovidas pelos sindicatos de todas as classes. Também pudera, é feio e pega mal fazer pressão e cobranças a companheiros de velhas e longas caminhadas. Os mesmos que há pouco tempo faziam a mesma marcha, os mesmos pedidos, num discurso afiado e dedos apontados para todos os erros e defeitos cometidos e acometidos pelos seus opositores. Na ocasião, ditos governo.

Engraçado que ao trocar de lado esses mesmos companheiros não enxerguem a solução para os velhos e conhecidos problemas. Pior, que adotem discursos, posturas, comportamentos e medidas antes amplamente criticados.

Pois é, o atual governo provou do próprio veneno, talvez por não acreditar que um dia chegaria realmente ao poder. E agora, embora nos bastidores e discretamente, ou melhor, por debaixo dos panos e dos tapetes, brigam entre si, já que pensamentos e interesses divergem dentro do mesmo grupo.

E nesse “fogo amigo” travado entre os companheiros, muitos já estão jogando a toalha, ou melhor, deixando as camisas e bandeiras de lutas e causas que defenderam por toda a vida para associarem a novos companheiros, já que os antigos não são mais reconhecidos em seus discursos, comportamentos e interesses.

(Quase um mês depois, mas finalmente atualizando o blog)

domingo, 25 de abril de 2010

Estrelas (de)cadentes

Por Catiane Magalhães

Como os astros que esporadicamente surgem no céu, em movimentos compassados e uma trajetória de queda livre, a cada ano fica mais extensa a lista de “estrelas cadentes” brasileira. A diferença está apenas na freqüência e no ritmo frenético com que estes famosos entram e saem (definitivamente) de cena.

Times inteiros de celebridades de terceira, quarta e quinta linha aparecem e desaparecem das nossas vidas com a mesma facilidade. O fenômeno teve uma explicação brilhante nesta semana, com a frase de Márcia Tiburi, uma das apresentadoras do programa Saia Justa, da GNT. Para a doutora em filosofia, isso só ocorre porque banalizaram o conceito de fama.

Concordo em gênero, número e grau. Para se tornar uma estrela da televisão nos dias de hoje não é preciso brilho próprio, muito menos um talento especial. Basta protagonizar algum escândalo, participar de um reality show, postar um vídeo bizarro no youtube, criar discussões/campanhas polêmicas no twitter, ter milhares de seguidores neste mesmo microblog, assumir, em rede nacional, a homossexualidade, usar um vestido provocante para ir a universidade, enfim, os critérios utilizados na seleção abrandaram completamente.

E devo aqui deixar claro que nesta disputa os homens estão em desvantagem. Afinal, predicados que renda às mulheres o nome de uma fruta ou planta e uma capa de revista masculina é acesso garantido ao “high society”. Nesta balança os atributos físicos pesam muito mais que os intelectuais.

O Big Brother Brasil se revelou um celeiro deste tipo de celebridade. Desde a sua primeira edição, há dez anos, até a última, recém encerrada, o programa faz uma ponte com os demais da emissora. Os participantes, independentemente do sexo e de ser, ou não, o vencedor, após sair da casa tem a chance de esticar os cinco minutos de fama, com passagem obrigatória, prevista em contrato, nos palcos de Ana Maria Braga, Faustão e participando de quadros no humorístico Zorra Total – tão decadente quanto os seus convidados, diga-se de passagem.

Da primeira casa, por exemplo, saiu o anencéfalo Kleber Bambam, que caiu na graça popular pela sua falsa ingenuidade e, principlmente, pelo péssimo português. De lá fez uma “pontinha” na patética Turma do Didi, de onde saiu para emissora concorrente devido às exigências feitas à Globo, por já se achar um astro maior.

Os mais sortudos conseguem contratos (ainda que temporários) com a emissora, como foi o caso do baiano Jean Wyllys, vencedor da quinta edição do reality show, que por um período foi repórter especial do programa matinal da loura e do louro José. Já a vice-campeã, Grazi Massafera, bonitinha e esforçada, mas péssima atriz, insiste em atuar, apesar das críticas.

Da mesma edição, a pernambucana Tatiana Pink, identificada como a queridinha do Sherman, abocanhou um quadro só seu no humorístico de sábado à noite. Apesar do suposto prestígio, seu estrelato também teve curta duração. Aliás, a quinta edição do Big Brother Brasil, do brother Bial, foi a que mais revelou astros e estrelas instantâneos, incluindo as que tiraram a roupa para a Playboy.

Já o polêmico BBB dez, que seria a edição da diversidade, mas teve como ganhador o lutador machão Dourado, coloca em evidência o Seginho, num quadro do Zorra Total, que, assim como o de Tati Pink, tão logo deve ser extinto e o protagonista jogado ao esquecimento. A razão? A falta de propósito, ora! Alguém, por favor, me explique o que ele quer dizer com o jargão “bate, rebate, finge que bate, faz carão”? Porque eu só não entendo, como não acho a mínima graça. Aliás, todo o programa está mais para drama que comédia.

Como o próprio Serginho falou, numa das suas declarações polêmicas, ele não entrou na casa brother pelo prêmio milionário, pois dinheiro não é o seu problema (sic). O seu interesse sempre foi visibilidade/popularidade. Se bem que eu acho bastante improvável uma pessoa com tal look passar despercebido na multidão.

De toda sorte, é bom que ele trate de fazer decolar a grife que pretende lançar. Caso contrário, mais dia, menos dia, ele, como os demais ex-brothers, não passará de um anônimo na infindável fila de ex-famosos. Mas o que se há de fazer, se a renovação é a lei natural da vida? Já nos idos dos anos 80, o maluco beleza Raul Seixas cantava, em sua música “O Homem”, que para uma estrela brilhar outra então tem que se apagar.

Como toda regra tem uma exceção, deixo aqui minhas congratulações à oriental Sabrina Sato e à loura caipira Íris Stefanelli, apelidada carinhosamente de Siri – seu nome inverso –, que ainda conseguem se manter diante das câmeras da Rede TV! A primeira como a repórter anencéfala do Pânico na TV e a última, totalmente insossa, à frente do TV Fama. Talvez por isso esteja com dias contados no programa, passando o posto para a jornalista Flávia Noronha.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Benditas sejam as más notícias...


Por Catiane Magalhães

Diante das tragédias locais, regionais, nacionais e até internacionais que pautaram os noticiários ao longo da semana, ouvi uma velha e conhecida, porém detestada, frase: “notícia ruim rende e vende mais”. Até aí tudo bem, pois sei do sucesso que tais notícias fazem entre os seus consumidores.

O que verdadeiramente me irritou foi o complemento de mau gosto: “jornalistas têm predileção a isso, não é?” – frase já dita, inclusive, pelo presidente Lula –. E sem qualquer pontinha de corporativismo digo que isto é uma grande inverdade e injustiça com nós que narramos, mas não fabricamos fatos.

Além disso, embora às vezes não pareça, a ditadura há muito já terminou e hoje cada um escolhe o que vai levar para casa, através das páginas de revistas e jornais impressos ou da telinha do computador e da Tv. Para isso, existe a democracia e o livre-arbítrio para optar pelas diferentes linhas editoriais dos milhares de veículos de comunicação que estão ao nosso alcance. Cada um consome o que se identifica e se identifica com aquilo que consome.

Mas, uma coisa não se pode negar: de fato, as tragédias, sobretudo as provocado pelas chuvas, dão uma certa tranqüilidade ao repórter, já que são pautas garantidas. Mas verdade seja dita e justiça seja feita, tais notícias agradam e beneficiam muito mais a certos políticos que a nós jornalistas. Me desculpe as raras exceções, mas os oportunistas de plantão são mestre em tirar proveito das desgraças e transformá-las em palanque eleitoral, trocando cestas básicas e materiais de construção por votos.

Em ano de campanha, benditas sejam as más notícias. As mesmas que alimentam a imprensa, garantindo a esta suas manchetes, também colocam em evidência os candidatos que se dispõe a posar de bons e solidários moços, durante breves visitas in loco, com direito a promessas e anúncios de envio de quantias que lhes garantam mais visibilidade que a solução do problema.

Talvez isso explique a preferência em adotar medidas emergenciais às definitivas, pois extinguir o problema significa também eliminar a possibilidade de comprar votos e posar como 'o salvador da pátria'. E por falar nisso, por que será que a tragédia no Haiti comoveu mais autoridades brasileiras que o desastre no Morro do Bumba, em Niterói, a ponto de deslocarem para aquele país e anunciar publicamente, diante das câmeras da imprensa do mundo inteiro, ajuda aos pobres e desvalidos de lá?

A resposta eu sei de cór: porque resolver o problema alheio é mais fácil que os nossos, já que estes nos colocam na difícil situação de identificar culpados e, principalmente, soluções. E neste caso, se aplica a velha máxima popular: “o que não tem remédio, remediado está”.

Aos que me dizem que, em jornalismo, notícia ruim rende e vende mais, eu respondo: em política, panela vazia de pobre é prato cheio, e urna também!

sexta-feira, 9 de abril de 2010

O tiro saiu pela culatra...


Por Catiane Magalhães

A máxima popular “o proibido é desejado” se confirmou nesta semana, com a exibição da entrevista com Guilherme de Pádua – acusado e condenado pela morte da atriz Daniella Perez, há 18 anos –, no Programa do Ratinho (SBT). O anúncio da ‘atração’ era uma nítida busca por alguns pontos no Ibope, mas o que realmente promoveu a audiência foi a tentativa, se não de proibir, de, pelo menos, coibir o acesso do público à entrevista, lançada pela mãe da vítima, a novelista global Glória Perez, e apoiada por amigos e seguidores no twitter.

O boicote teve efeito colateral e levou muita gente a sintonizar a emissora à espera da edição inédita. Aliás, boa parte do público tomou conhecimento da programação através do próprio microblog e das campanhas pela não audiência, ou seja, o esforço concentrado para impedir a veiculação da entrevista só atiçou a curiosidade alheia.

Eu mesma faço parte desta estatística, pois não sou telespectadora da emissora de Sílvio Santos, mas, diante dos posts no twitter, e por não comungar da mesma idéia de Glória Perez, por achar que fere os direitos de liberdade e expressão e de ir e vir do cidadão, resolvi checar o conteúdo do programa amplamente repudiado pela mesma.

Não sou nenhuma defensora dos direitos humanos, mas sou declaradamente contra qualquer tipo de censura, mesmo as motivadas em nome do amor. Do mesmo modo, sou totalmente contrária a programas sensacionalistas, mas não se pode ignorar o tempo que o assassino confesso passou atrás das grades. Se a justiça foi feita ou não, se os quase sete anos de reclusão não foram suficientes, não cabe a ela decidir, o que deve ser levado em conta é que Guilherme cumpriu a pena e, portanto, pagou, em tese, a sua dívida com o judiciário e com a sociedade.

Aliás, a campanha impetrada pela mãe da vítima vai na contramão de uma outra, lançada pelo governo Federal, através do Conselho Nacional de Justiça, para reinserir ex-presidiários no mercado de trabalho e no convívio social, dando-lhes a chance de “começar de novo”, como é intitulada a peça veiculada em várias emissoras, inclusive na empresa que Glória trabalha, a Globo.

Tanto por nada – O fato é que se criou uma enorme expectativa para nada, literalmente. A promessa do apresentador Carlos Massa, o Ratinho, em quebrar um silêncio de quase duas décadas, revelando para o Brasil o que motivou o crime bárbaro, não se concretizou. O convidado não falou nada que já não tenha sido dito e redito ao longo de todos esses anos, com uma diferença: um discurso arrependido, de um ‘ex-torto’ e agora evangélico, temente a Deus. E sem querer fazer juízo de valor, tudo isso soou mais como uma encenação de quem, mesmo longe dos palcos e das câmaras, devido encarceramento, não esqueceu a arte de interpretar.

Nitidamente confuso e nervoso, e sob o argumento de proteger a própria pele, Guilherme optou por deixar a sociedade sem resposta e não apresentar a sua versão para o acontecimento. Mesmo o ar de quem decorou algumas passagens bíblicas para impressionar não convenceu, pelo contrário, só provocou a ira do apresentador – frustrado por não conseguir dar o furo de reportagem –, que após várias tentativas de arrancar respostas, vendo o tempo se esgotar, saiu do cenário visivelmente irritado com o seu convidado e dizendo, ainda com os microfones ligados, que se estivesse no lugar de Glória Perez (com quem o próprio teria trocado algumas farpas pelo twitter) também não perdoaria o assassino.

E o tiro novamente saiu pela culatra. Diante do espetáculo que antecedeu a exibição do programa e na guerra incessante pela audiência, o apresentador, cuja credibilidade já é duvidosa, teve a sua imagem mais uma vez associada ao ridículo e a incapacidade de realizar aquilo que se propôs fazer.

domingo, 4 de abril de 2010

Mais do Mesmo...

Por Catiane Magalhães


Definitivamente o ano não começa em primeiro de janeiro. Não no Brasil, com sua diversidade de calendários. Na Bahia, por exemplo, o réveillon só chega após o carnaval, e engana-se quem pensa que somos o único povo retardatário. Na televisão brasileira (leia-se Rede Globo) o ano só começa em abril, com o anúncio da grade de programação dos seriados, novelas e filmes – tão inéditos, quanto o RC Especial nas noites de 24 de dezembro – que serão exibidos até o final do ano, que há muito deixou de ser novo.

E por falar no rei, ficou por conta dele a estréia da programação de 2010 da emissora líder em audiência no País. Depois de quatro meses assistindo a reprises, melhores momentos ou a programas inteiramente iguais aos do ano passado, a Globo exibe, em primeiro de abril, o Emoções Sertanejas. Coincidência ou não, a releitura do RC Especial de Fim de Ano mais parecia uma piada de mau gosto para a data, bastante propícia, diga-se de passagem.

Como sempre, convidados interpretando as mesmas canções, as mesmas emoções. Desta vez, um detalhe faz a diferença: sai as musas do Elas Cantam Roberto e entram as duplas sertanejas para, com o ritmo homônimo, darem nova roupagem às suas músicas que já foram cantadas e recantadas em todos os tons e notas, inclusive pelo próprio ex-integrante da Jovem Guarda.

A troca dos personagens, entretanto, não fez a versão parecer menos familiar. Pelo contrário, as cantigas, os convidados e, é claro, a presença do homenageado, causou, pelo menos na minha cabeça, uma grande confusão. Por um breve instante fiquei na dúvida se ficaria à espera de Papai Noel ou do Coelhinho da Páscoa.

Passado o momento da incerteza, que só se foi após uma ligeira conferida no meu calendário de cabeceira, lembrei de uma música de Renato Russo que descreveria com precisão a minha sensação naquela ocasião: “Sempre mais do mesmo, não era isso que eu queria ouvir”!

Pior mesmo foi a sensação experimentada de aguardar quatro meses para ver o ano novo da Globo começar e achar que voltei no tempo, apenas com o auxílio do aparelho de TV. Justo eu, que se pudesse embarcar numa máquina com tal poder, pediria para ver o amanhã, o mês e, quem sabe, o ano seguinte.

E pegando o gancho no espiritismo, que tem pautado a emissora, com direito a documentários, reportagens, novelas e divulgação do filme sobre a vida do médium Chico Xavier, o tema também não poderia escapar aos meus comentários. Os adeptos que me perdoem, mas não consigo compreender que diabos levam uma pessoa a se submeter à regressão para descobrir, sem opção de alterar, o que já passou.

Ainda como o aniversariante da semana, Renato Russo, eu prefiro insistir nessa saudade que eu sinto de tudo que ainda não vi à ser telespectadora desse museu de grandes novidades, se me permitem citar o também poeta, igualmente morto, Cazuza.

O show da vida...

Por Catiane Magalhães

O slogan é do fantástico, mas veio a calhar na semana em que o País inteiro parou diante da televisão para acompanhar cada minuto, cada detalhe, do julgamento do casal Nardoni – agora condenado pelo assassinato da pequena Isabella. Um batalhão de repórteres, câmeras, microfones e gravadores dividiram o espaço com outra multidão de anônimos curiosos, que encontraram ali um palco para ter seus míseros cinco minutos de fama, afinal o acontecimento tornou-se uma espécie de reality show mais vigiado do momento.

A imprensa cumpriu, e muito bem, o seu papel. Todos os noticiários – televisivos, impressos, radiofônicos e eletrônicos, davam informações do caso, atualizadas a todo o momento. A troca de olhares dos acusados, um suspiro da mãe da vítima, a afirmação de uma testemunha, nada escapou às lentes das câmaras que se voltaram para o Fórum de Santana, zona Norte da capital paulista. O crime que chocou o Brasil contou até com o apoio de novas ferramentas tecnológicas para ser transmitido e comentado, em tempo real, pelo Twitter.

Durante uma semana inteira o assunto era o principal destaque, para o alívio dos corruptos de plantões que tiveram aí uma folga e caíram num breve esquecimento. Mas o que chamou, de fato, a minha atenção para a cobertura foi a espécie de espetáculo em que transformaram o episódio. Enquanto repórteres narravam um clima tenso dentro da sala do tribunal, as imagens externas mostravam o comportamento paradoxal da população, que, escondida atrás de cartazes e pedidos de justiça, queriam mesmo era veicular sua imagem em rede nacional, com exceção, é claro, de uma meia-dúzia que realmente se compadeceu com sofrimento da vítima e da mãe dela – a maioria motivada pelo instinto materno.

Afora essa minoria, o que se viu na porta do Fórum de Santana foi uma espécie de carnaval fora de época, com gente fantasiada, mascarada e de cara pintada, num só coro por justiça. No entanto, as mensagens mostradas eram: “Filma eu”, “Julgamento de Isabella, eu fui!”, “Mãe, olha eu aqui”.

E como brasileiro é criativo, teve de tudo: desde Cristo carregando uma pesada cruz à aspirante a escritor, que levou seus livros para divulgar e comercializar no local. Este último, um baiano, radicado em São Paulo há anos. Em entrevista, ele confessou ter procurado todas as emissoras para tornar público o seu trabalho e como não conseguiu resolveu ir ao julgamento, onde encontraria toda imprensa num só lugar.

Em meio à polêmica sobre a decisão do juiz em manter Ana Carolina Oliveira isolada para uma possível acareação com os assassinos da sua filha e às explicações da defesa, eis que surge a avó materna da vítima, dona Rosa, (mãe da própria Carolina) acenando para a platéia com sorrisos, beijinhos e tchauzinhos, como se fosse ela uma celebridade.
E por já estarmos acostumados com essas inversões de papéis e valores, achamos normal o comportamento daquela senhora diante das câmaras e dos “fãs”, pois naquele momento ela era mesmo uma celebridade, disputada pelas emissoras para dar uma palavrinha apenas. E assim o fez prontamente: atendeu a todos os pedidos de entrevista e finalizava sempre exibindo a tatuagem com o nome da neta no braço.

Após longos cinco dias de angústia pela espera de um resultado que fosse favorável para a população sedenta por justiça, ou seja, pela condenação dos réus, que posteriormente seria comemorada com muita música, dança, gritos e fogos de artifícios, finalmente sai a sentença esperada. Pai e madrasta são considerados culpados e voltam para a prisão. O julgamento termina, o show lá fora, não!

A disputa pelo microfone e pelas câmaras é ainda maior entre os anônimos que aguardavam – entre eles, muita criança, principalmente de colo, que não entendiam o que se passava e muito menos o que estavam fazendo ali, durante todo aquele tempo –.
Entre as poucas palavras proferidas após o veredicto, a defesa se recolhe e reconhece que “o brilho da noite foi todo da promotoria”. Sim, o advogado Roberto Podval estava atribuindo ao promotor Francisco Cembranelli, e não ao trabalho desempenhado por este, um estrelismo.

Diante de tudo isso, a mais sensata e reservada foi a própria Ana Carolina. Envolvida por sua dor, ela disse, numa das suas poucas aparições, que apesar de tudo que aconteceu durante a semana e da justiça ter sido feita nada traria a sua estrela Isabella de volta.